O Papa do Underground é Pop – Parte I

O Papa é pop.
O Papa é pop.
O Pop não poupa ninguém”
Engenheiros do Havaii, “O Papa é Pop”

Robert Crumb havia autografado muito mais do que os 40 livros previamente acertados, e mesmo assim a fila de fãs ávidos por uma assinatura não dava sinais de diminuir. Então em um movimento no mínimo inesperado para alguém com 70 anos, Crumb subiu na cadeira, pendurou-se no corrimão da escada atrás dele e foi ao banheiro, só saindo quando tinha certeza de que não encheriam mais o seu saco. A esta altura eu já estava em uma lanchonete na Cardeal Arcoverde com outros nerds falando merda, comendo pizza, bebendo cerveja e rindo de piadas que ninguém de fora daquela mesa poderia entender. Em certos momentos eu tinha pena da pobre moça que nos atendia.

Robert Crumb

Ele e Gilbert Shelton vieram para o Brasil participar da Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e deram uma passada na Livraria da Vila para um bate-papo com seus fãs. Fiquei realmente empolgado com o evento ao saber que Caco Galhardo seria o mediador da mesa. Meu real objetivo era conseguir um autógrafo dele e não do Crumb. Então antes de sair para o trabalho enfiei na mochilla um exemplar de “Zap Comix” e o álbum “You have been desconected” e aproveitei para reler no caminho.

Como saio de São Mateus às 18hrs e o evento começava as 19hrs, é claro que cheguei atrasado. Encontrei o Mário, o Shinkoheo e o André no Metrô Clínicas e lá fomos nós. A livraria estava abarrotada de gente e só consegui ver o Crumb de costas e um teco da barba do Shelton. Pelo menos dava pra ouvir direito as perguntas e respostas.

Gilbert Shelton

O que eu não entendo é como alguém faz um evento em um lugar que obviamente não tinha a mínima estrutura para suportar decentemente metade do público que compareceu. Eu mesmo estava em uma escada atrás da mesa e esta maldita escada era a entrada para os jornalistas cadastrados, VIPs e pessoas bonitas, de modo que a todo momento eu tinha que tentar arrumar espaço para alguém passar e levava um empurrão do segurança. O banheiro ficava depois da mesa e do público, então qualquer um que quisesse se aliviar acabaria fazendo no caminho. Podem alegar que é propaganda para a livraria, mas duvido que 10% de quem estava lá tenha comprado algo e aposto que os habitués adoraram ver o lugar invadido.

(Um funcionário comentou que existem unidades maiores da Livraria da Vila, mas parece que o público nelas é fresco e gasta o suficiente para vetar eventos do tipo)

Deu para perceber que Crumb e Shelton estavam mais à vontade do que na FLIP (talvez porque desta vez suas esposas estivessem longe) e é incrível como o o criador dos Freak Brothers não se incomoda em ficar à sombra de seu companheiro. Todas as perguntas eram feitas para o Crumb e depois o Shelton dizia sua opinião. Mais de uma vez esqueceram que ele estava lá e alguém do público gritava “O Shelton não respondeu!”.

Mas o que realmente me surpreendeu foi o imenso número de cosplayers do Robert Crumb. Já trabalhei em duas bienais do livro, duas festas do livro na USP, 4 Fest Comix. Já trabalhei dois anos em uma comic shop em plena Rua Augusta. E em nenhuma dessas ocasiões eu vi um único ser com o visual parecido com o do “papa do underground”. Já lá na Livraria da Vila eu contei pelo menos uns 9 sujeitos vestidos lá Crumb, sendo um deles inclusive famosinho no meio das HQs nacionais. Patético, para ser minimamente educado.

Caco Galhardo

O evento estava legal até começarem as perguntas do público. Salvo algumas exceções, a maior parte das perguntas foi péssima. Pior era quem achava que sabia falar inglês e perguntava para os dois direto, aí os gringos não entendiam e o cara tinha que fazer a pergunta de novo em português paro intérprete fazer no inglês correto. Vergonha alheia total. A coisa tava tão feia que acabei indo conversar com outros caras de saco cheio ali pela livraria. Acabei encontrando alguns conhecidos do ramo. Falamos mal da Panini, trocamos cartões, o de sempre.

Finalmente acabou a sessão de perguntas e eles iam começar a autografar os livros. Encontrei uma amiga que trabalhava em uma editora presente ali e fomos falar com o Galhardo. Com a galera se matando pra conseguir relar um dedo no Crumb e no Shelton, foi fácil chegar no autor de “Os Pescoçudos”, trocar uma idéia e conseguir meu tão esperado autógrafo. Com a missão pessoal cumprida, saí da livraria, encontrei o resto do povo e então vinha a busca mais difícil de todas: achar um lugar barato para comer na Vila Madalena.

(continua…)

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Comentários

  • agrt  On 13/08/2010 at 0:12

    Já vi até comunista citando frases da passagem do Robert Crumb pelo Brasil. Mas de qualquer maneira, mesmo sem estrutura e tra lá lá, é uma desculpa pra juntar uma galera pra ficar falando besteira. Isso do povo falando merda em inglês me lembrou uma palestra sobre literatura arturiana que assisti uma vez, na qual o palestrante misturava inglês e espanhol pra falar e os slides dele tavam em francês, na hora das perguntas, como seria evidente, foi um desastre.

    • Alessio Esteves  On 13/08/2010 at 3:17

      Essa do comunista citando Crumb foi uma twitada do Plínio de Arruda Sampaio do PSOL.

  • coringa138  On 13/08/2010 at 0:23

    O underground tá na moda.

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